30 de novembro de 2007

Shari'a

Por ter equiparado aquele magnífico golo à aparição terrena do Profeta, o até aí treinador Kalil Kadryia foi condenado a 40 chicotadas psicológicas.

29 de novembro de 2007

Renovação de Votos

Só para reafirmar amor absoluto a John Darnielle e aos The Mountain Goats, uma das poucas coisinhas musicais realmente excitantes que [me] aconteceu nos últimos anos (é triste, é).

Em Fevereiro chega Heretic Pride (4AD).

28 de novembro de 2007

E depois

ainda há aqueles bloggers que descrevem a blogosfera como se eles próprios fossem o Ziggy Stardust e não tivessem nada a ver com nada.

Contra a Corrente

Há desafios que, feitos em cadeia pelos blogs, correm micro-universos à velocidade da luz e conseguem dar cabo da cabeça a quem lhes adere. Querem muito, acham um piadão a alguns mas, porra, lá se vai o blasé pró maneta (dupla referência ao VPV, que ele às vezes só lhe falta pedir). Vai daí aderem à coisa salvaguardando que 1) é só por ter vindo de fulan@, 2) alinham mas interrompem a cadeia porque caridade é diferente de andar a pedir esmola (culpado!), 3) alinham mas subvertem as regras, ou seja, alinham desalinhados pelo que só alinham um bocadinho ou praticamente pode dizer-se que não alinham, 4) nem sabem bem por que raio estão a alinhar mas como nunca alinharam vão alinhar agora ou 5) todas as anteriores (estado-limite de qualquer coisa).

E tu, tens algum problema com as correntes? Porquê? Passo este desafio à... Nã... Eu não alinho nessas merdas.

27 de novembro de 2007

Cadernos do Cinema [5]

The Royal Tenenbaums (2001)

A história de um homem que passou a vida desligado da família e regressa com o alibi de uma doença mortal para recuperar os vínculos perdidos, não é propriamente nova. Os mitos das civilizações e da espécie também as sintetizam e já foram identificados. Dentro do mesmo quadro mudaram os ângulos e inventaram-se os grandes planos. The Royal Tenenbaums é uma (boa) colecção de grandes planos, exagerados à caricatura. Não com a câmara, mas na especialização das personagens. Cada uma poderia ter dado origem a um filme, noutros tempos, e a história encarregar-se-ia de os transportar. Agora são essencialmente as personagens a transportar os filmes, treinam-se os mitos individuais. Fico curioso sobre o próximo plano.

26 de novembro de 2007

Controlo de danos [8]

O conceito de Paraíso é uma disfarçada admissão de que a Obra terrena foi um fracasso, mais rotunda menos rotunda. O mundo correu mal e mesmo assim pedem-nos o mandato eterno. Eu digo: eleições, já!

24 de novembro de 2007

This Nation's Saving Grace

The Fall, 1985. Nada como um bocado de normalidade para desligar a máquina da maluqueira.

(Aos que conhecem The Fall e ficaram desorientados: sim, os meus dias são estranhos.)

23 de novembro de 2007

Old College Try

The Mountain Goats | Tallahassee

From the housetops to the gutters From the ocean to the shore The warning signs have all been bright and garish Far too great in number to ignore From the cities to the swamplands From the highways to the hills Our love has never had a leg to stand on From the aspirins to the cross-tops to the Elevils But I will walk down to the end with you If you will come all the way down with me From the entrance to the exit Is longer than it looks from where we stand I want to say I'm sorry for stuff I haven't done yet Things will shortly get completely out of hand I can feel it in the rotten air tonight In the tips of my fingers In the skin on my face In the weak last gasp of the evening's dying light In the way those eyes I've always loved illuminate this place Like a trashcan fire in a prison cell Like the searchlights in the parking lots of hell I will walk down to the end with you If you will come all the way down with me

Avante devagarinho

O meu PC está mais lento que o da Soeiro Pereira Gomes.

Jeronimooooooooooo!...

Hard Core

O Binya, um jogador da bola, fez isto. Não ponho aqui as imagens porque tenho vergonha; quem quiser ver, siga o link. A UEFA atribuiu-lhe uma suspensão de 6 jogos. O clube empregador do Binya protestou e recorreu do castigo. Percebe-se a indignação. De facto, 6 jogos de suspensão para punir uma coisa destas é completamente ignóbil. A decisão da UEFA só não é mais sórdida que o próprio acto porque o acto é dos mais sórdidos que o futebol profissional já teve de digerir.

22 de novembro de 2007

Controlo de danos [7]

Se nada se perde, tudo se transtorna.

(Lavoisier quasi dixit)

Controlo de danos [6]

Da política aos grupos à vida mental aos sofistas, passando pelos sacos de berlindes, a reacção à mudança baseia-se no temor da perda. Mesmo que da perda de uma mão cheia de nada, ou de uma mão cheia de merda. O conservador não quer evitar a nova ordem, apenas controlar os danos. Quem tem cu tem medo. A revolução propõe-se (impõe-se) trans-formar ou, acima de tudo, momentaneamente abrir as comportas? É que geralmente fica-se por aí. A revolução, geralmente, é obra de conservadores idealistas.

21 de novembro de 2007

Controlo de danos [5]

Leo Touchet | The New Orleans Jazz Funerals | Rejoice When You Die

20 de novembro de 2007

Controlo de danos [4]

Não são para levar muito a sério, algumas divagações existencialóides. Sou apenas eu a organizar-me. Melhor dito, sou apenas eu quando, geralmente, começo a ficar farto de uma linha de raciocínio. Mato escrevendo o que me parece já ter dado o que tinha a dar. Cadáveres em arrefecimento. É melhor do que roer as unhas.

19 de novembro de 2007

Controlo de danos [3]

Seek freedom and become captive of your desires.

Seek discipline and find your liberty.

Frank Herbert | Dune

Controlo de danos [2]

O grande impacto que a noção de morte tem no funcionamento mágico da infância segue-se às primeiras congeminações sobre a irreversibilidade o peixe ou o cão ou o avô não voltam»). Daí até à universalidade toca a todos») é um pequeno passo. O real parece então levar dianteira, mas aquela que poderia (deveria?) ser a última grande aquisição nem sempre acontece: o desconhecido post-mortem é combatido por religiões e outros sistemas filosóficos, mais ou menos sofisticados. O desconhecido é tramado, entre outras razões porque parece ameaçar a individualidade (selfness). Por outro lado, quanto mais a pessoa se pensa mais mortal se torna. Quando se percebe que o fim é certo, reactualiza-se a inocência perdida, em que a morte já foi apenas um son(h)o possível de ludibriar; como nas refeições totémicas de incorporação do corpo e sangue de um dos que lhe sobreviveu (o corpo e o sangue daquele que ressuscitou) , por exemplo. Comei e bebei todos, este é o meu corpo, este é o meu sangue, entregue por vós. Quando se pode escolher entre uma eterna dívida e uma dúvida, a resposta brota, naturalmente.

18 de novembro de 2007

Controlo de danos [1]

Se calhar substitui-se a capacidade inicial de descobrir tudo e mais alguma coisa pela de (re)conhecer o belo. A diferença entre inventar o mundo e apreciá-lo. Nem tudo se perde, mas o que se perde é irreparável e muito importante e difícil de superar.

Stanley

Anthony Hare | Kubrick

Como dizia o outro:

Obrigado.

17 de novembro de 2007

Como dizia o outro:

Entretenham-me (porra). Dancem. Lap-dancem. Façam o pino.

16 de novembro de 2007

É a cultura estúpida

Arábia Saudita: Mulher violada é condenada a 200 chibatadas

Antes de se indignar pense naquela coisa da diversidade cultural e do respeito pela diferenciação etno-lá-lá-lá.

Punch & Judy

Qualquer coisa lhe servia de motivo para retoricamente espancar tudo e todos. Quando não apanhava ninguém a jeito, quando todos conseguiam gerir as suas provocações paradoxais sem solução aparente, chegava a casa e exigia jogar Scrabble com a mulher, estivesse ela a dormir ou a ver os resumos da Premier League. Até certa e determinada altura, o grande segredo dela era que, já desde há um par de anos, via-se obrigada a fingir as derrotas. Tinha-se tornado exímia, à força de tanta pancadaria. Os amigos, colegas e conhecidos, porém, não tiveram a mesma sensibilidade. Quando perceberam que podiam finalmente fazer-lhe alguma sombra, trataram de lho demonstrar. Nunca mais o Senhor Punch venceu um debate: primeiro nas reuniões da assembleia de vereadores, o que implicou que coisas começassem, finalmente, a ser construídas na vila; depois no café, com a consequência de um assombroso decréscimo nas vendas de bebidas alcoólicas, tão empenhados estavam em permanecer sóbrios para poderem humilhá-lo quando se discutissem sinónimos de «concupiscência» em palavras com mais de 7 sílabas e sem recurso a estrangeirismos. O golpe de misericórdia foi finalmente dado pela esposa. Na noite que se seguiu a um dia para esquecer, o Senhor Punch preparava-se para mitigar a raiva em mais uma arrasadora vitória no tabuleiro. Mas Judy denunciou a sua mestria ao arquitectar uma palavra quase impossível, desferindo o golpe fatal com a enunciação, de memória, de todas as falácias, por ordem crescente de imbecilidade, que teve de engolir para manter acesa a periclitante chama daquela relação. Semanas antes tinha conhecido e iniciado uma fogosa aproximação ao dono de um império das sopas de letras.

15 de novembro de 2007

13 de novembro de 2007

Para mais tarde recordar. Mais cedo ou mais tarde. Quando for preciso.

Paulo Portas digitalizou milhares de documentos enquanto percorria o espaço entre a secretária e a saída do seu gabinete no Ministério da Defesa. Como estava tristonho, ainda demorou algum tempo a cumprir aqueles metros. Se calhar demorou dias e dias a fio. De fio a pavio.

Em memória

Na Faixa de Gaza, daqueles que compareceram ao comício em memória de Yasser Arafat, 6 morreram e praí uma centena ficou ferida. O homenageado pode continuar a descansar em paz: ao contrário dos ventrículos dos mais azarados, o seu espírito permanece bem vivo.

O Idiota [2]

Agora não podia falhar, já tinha morrido uma vez. Não falhou; continuou sempre, olhos no horizonte, pensamento esvaziado, corpo-machina. Quando alcançava terra magoava-se no nariz e despertava. Voltava-lhe tudo. Corria para o fim daquele mundo e mergulhava e respirava, sempre em frente.

Ref: O Idiota

[img] Lance W. Clayton

12 de novembro de 2007

Acabou-se-lhes a mama!

O ministro das Obras Públicas, Mário Lino, revelou esta segunda-feira que a Estradas de Portugal (EP) vai ter a concessão da rede rodoviária nacional por um período de 92 anos.

É para que não julguem que podem continuar a comer-nos de cebolada. Ou cumprem o plano rodoviário, asseguram a manutenção em condições e assumem as responsabilidades devidas a qualquer falha, ou não há prolongamento da concessão. 92 anos e nem mais um dia! É que já chega de caldinhos com o dinheiro dos contribuintes. Ai o caraças...

11 de novembro de 2007

Não se cala porque não sabe o que isso é

O episódio protagonizado por Hugo Chávez, o rei Juan Carlos e Zapatero na Cimeira Iberoamericana está a ser comentado por meio mundo. Uma parte significativa da blogosfera portuguesa já lançou ao ar tanto fogo de distracção que quase conseguiu perder (e fazer perder) o foco da coisa. O pseudoargumento mais usado tem a ver com a legitimidade democrática e as origens do poder do rei e do presidente venezuelano: tentam comentar o caso sem praticamente falar do caso. 1) A legitimidade de ambos participarem na cimeira é exactamente igual. Sendo, por princípio inabalável, contra qualquer forma de governo monárquico, parece-me óbvio que ninguém contesta a presença do rei de Espanha no encontro de Santiago do Chile. Antes deste episódio, pelo menos, não me lembro de ler ou ouvir nada sobre o assunto. 2) Convém ver toda a sequência da intervenção de Zapatero e das constantes interrupções a que esteve sujeito, vindas de Chávez, a ponto de não conseguir articular meia frase; e não a maior parte dos excertos que circulam na net, apenas com o momento da repreensão. Isto é a forma e é o mais importante. Se o presidente da Venezuela tivesse usado o seu direito a dizer o que pensa do que quer que seja, por muito ofensivo e mal-educado que fosse (como foi) em termos de conteúdo, mas tivesse depois a capacidade de ouvir o que os outros tinham para lhe dizer a ele, pouco ou nada haveria a comentar. Nem o próprio Juan Carlos lhe teria sugerido que se calasse. Mas Chávez não consegue ouvir nem discutir. O seu modelo cubano é a resposta para se perceber o pequeno episódio: a forma de comunicação que os ditadores privilegiam é o monólogo, o absolutismo das suas ideias sem conceberem qualquer outra modalidade que lhes embarace a omnisciência. O silenciamento das televisões, a repressão das manifs e a alteração da constituição venezuelanas dizem tudo e é tudo o que basta recordar para compreender o que se passou.

10 de novembro de 2007

Zidane - Un Portrait du 21e Siècle

Só pode ser deslumbrante. Zidane foi um cometa belíssimo, maior do que a própria arte que executou. (Falta muito para chegar ao Porto?)

9 de novembro de 2007

Grow Up!

Os dois portugueses acusados de profanar a bandeira nacional da Letónia concordaram em assinar um acordo com o Estado letão, no qual se declaram culpados, evitando assim a realização do julgamento.

E pronto, assim se encerra mais um parágrafo sobre a eterna infância do Homem: putos-grandes que ainda associam a diversão ao vandalismo e estados que sacralizam ícones e símbolos como se eles fossem (e não apenas representassem) a sua identidade.

7 de novembro de 2007

Moscovo

Nada como uma escala em Moscovonada» é como quem diz: escusava de ser virtual...), com paragem em cada uma das suas magníficas estações de metropolitano, pejadas de iconografia alusiva à revolução. Igrejas à revolução.

1917-2007

Por estes dias, o Arrastão publica e linka vários textos e imagens à volta dos 90 Anos da Revolução Russa. A maior ou menor parcialidade de cada um não é problema, quando estão asseguradas as principais perspectivas ou assumidos os desvios (como é o caso). Excelente serviço ao público.

[img] A Soviet Poster A Day

6 de novembro de 2007

Supernada

"It's better to burn out than to fade away". Neil Young dixit e, com aquele apelido, somado a uma vida recheada de turbulências, tudo indicava que explodiria como uma supernova. Parece que não. Como muitos, levantou-se e caminhou. Outros, como alguns, consomem-se em si mesmos e ofuscam as galáxias. Mas o brilho esvai-se, tal como o espanto e a cegueira provocados em quem assiste ao magnífico burn out. Habilidade é ser-se mais um e mesmo assim saber-se «algo». Saber-se único no meio da curva de Gauss, eis o grande desafio do Universo para hoje, Terça-Feira. É extraordinário como o brilho de uma supernova termina numa questão de semanas ou meses, sendo que tudo nestas coisas costuma medir-se em unidades tão grandiosas que geralmente ultrapassam o entendimento.

O tal cálice

Ser-se compreendido, a diferentes níveis, com as mesmas frases, por diferentes pessoas, seduzindo todos, conquistando os mais fortes.

5 de novembro de 2007

Old Demotic

Chovem canivetes abertos. Não é a primeira vez que chovem canivetes, em Old Demotic. Ninguém liga, apesar dos esgares de enfado. Já choveu todo o tipo de coisas. Os velhos lembram-se de se terem esquecido daquele ano em que choveram mulheres. Conta-se a alegria que foi: as poucas que não morreram, amparadas pelos toldos das lojas ou absorvidas pelas águas do rio passaram a integrar a pacata comunidade. Não foi fácil porque eram especialmente belas e muitos casamentos fossilizados começaram a exibir brechas estruturais. Mas desta vez chovem canivetes abertos.

As estradas animam-se de faíscas ao contacto com as lâminas. Numa terra como esta as pessoas habituam-se a caminhar debaixo das protecções que as casas oferecem por decreto autárquico. Os estragos materiais foram imensos: automóveis, semáforos, uma instalação de esculturas em papel e plasticina no recreio da escola. Arruinados.

Naquela noite, como em todas as que se sucedem aos dias em que chovem coisas pesadas, haverá reunião popular espontânea. Discursarão os mesmos de sempre: os invejosos, o ridículo, os avarentos, os advogados, o ingénuo e o padre. As reuniões da chuva foram sempre um bom terreno para aprofundar conhecimentos, iniciar relações, romper ou propor negócios mirabolantes. Raramente se decide o que quer que seja sobre o produto acumulado daquilo que cai dos céus. Old Demotic possui, a cercá-la, uma vasta cordilheira de resíduos; alguns valiosíssimos, como quando choveram anéis da Opus Dei, outros (a maior parte) o autêntico refugo dos deuses.

Tomané, o radialista, passou o dia suspeitoso. Pouco falou a entremear as longas peças de rock progressivo que insiste em difundir pelos lares e lojas daquela terra. Tomané cogita, há já várias horas que se distingue claramente a ruga do intrigado, a circunvolução que lhe une as poderosas sobrancelhas como a estrutura de uns óculos de que nunca precisará porque, como diremos, o fim está próximo. Não compreende porque raios os canivetes abertos caem com a lâmina para baixo, se o corpo do objecto onde a mesma se recolhe é incomparavelmente mais pesado e o magnetismo terrestre liga a essas coisas.

Tomané ainda não sabe e a comunidade muito menos, mas o fim está próximo. Deus começa a perder as estribeiras. Depois de anos, séculos a pilheriar Old Demotic, prepara-se para ignorar todos os mais básicos princípios da decência, que é o que chamamos por ser o que acontece quando as leis da lógica de um povo são subvertidas.

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Resgatado ao vazio bonito (rip).

A/C Balthus, Borges, Calvino e Joshua Brand + John Falsey ("Northern Exposure")

[img] Balthus | La Rue | 1933

4 de novembro de 2007

3 de novembro de 2007

Querer saber

Como (bem) explica Vasco Pulido Valente no Público de hoje, "o sistema de ensino tende a 'reproduzir' e não a 'corrigir' a hierarquia social". A utópica e reivindicada «igualdade» como produto da escola ideal esbarra constantemente no real, essa categoria tirânica. Começa agora a impor-se como evidente a incapacidade do estado, pelos métodos tradicionais, para homogeneizar as oportunidades. O problema é que a escola chega tarde. Chega aos 6 anos de idade e para trás vão muitos mais do que seis, vão os anos das gerações familiares e das suas condições de vida que, salvo alguns rasgos, tendem a perpetuar-se. Famílias com algum poder (económico, social, cultural, etc.) conseguem proporcionar melhores oportunidades aos filhos porque elas próprias já as tiveram e aproveitaram.

A única possibilidade de esbater o fosso entre as oportunidades passa por alterar mentalidades. Razões históricas (onde quase tudo pode ser encaixado) tratam de modelar o português, em algumas das suas características. O corte epistemológico ainda é tarefa colectiva, porque o homem é egoísta por defeito. A sobrevivência colectiva protege o indivíduo, mas a sobrevivência individual é mais básica. Não há colectivo sem indivíduos. As discussões sobre a qualidade do ensino secundário e superior são inócuas, invertem a ordem natural das coisas, fazem chover no molhado. A única hipótese é subir o nível dos escalões socio-económicos baixos e médios (a revolta contra os mais ricos é primária e invejosa), e isso só é possível com mais e melhores competências individuais. Já para não falar do momento que se segue ao nascimento, onde tudo deveria começar, passemos directamente aos jardins de infância: é aí, no ensino pré-primário e na escola primária que quase tudo se decide. É aí que reside a mais importante porta de entrada para alterar mentalidades herdadas, o resto sucede-lhe. As palavras-chave são curiosidade e epistemofilia. Desejar, precisar de conhecer e de saber. A perfeita antítese da narcolepsia instalada. Sem isso, nada feito.

B(h)asta la victoria!

Os dentistas venezuelanos estão a ver a coisa muito (mal) parada. Parece que ultimamente já ninguém pode abrir a boca.

2 de novembro de 2007

True Man Show

A Writers Guild of America declarou greve, suponho que por intermédio do gabinete de Deus, o primeiro-argumentista. Fiquei a pensar que bem podemos dar-nos por felizes, assim longe dos states. Uma coisa destas afecta as pessoas. Imagine-se uma temporada de absoluto livre-arbítrio, sem nada escrito. Fadistas em colapso, igrejas arruinadas até aos alicerces, agências de publicidade que apenas diriam «se precisar de mais papel higiénico, compre uns rolos», nada de sugestões a rabos saudáveis em perfumados jardins de folha dupla como meio caminho para a felicidade. Seria o fim, caos e desordem, termos as vidas à disposição. Já para não falar das audiências.

1 de novembro de 2007

Balance

Wolfgang & Christoph Lauenstein (1989)

Era pró Inferno, sefaxavôre...

Mesmo correndo o risco de ser injusto para aqueles três que não encaixam no retrato, venho por este meio declarar raiva a essa figura compósita 'taxi-taxista'. Apesar de me divertir com histórias e episódios da corrente filosófica em causa, cada vez tenho menos pachorra para aturar a estupidez com que a maior parte se apropria das ruas. Já nem falo de gentileza: arrogância, incumprimento das regras mais básicas, desprezo absoluto pelos restantes condutores. Decidi não me desviar de taxis, quando andar de carro, mesmo sabendo que quem bate, paga e nem sempre quem fez a merda é quem bate. Quando voltarem, pela trilionésima vez, a sair da praça sem aviso e sem olhar, quando me empurrarem para o lado sempre que pretenderem fazer o que lhes apetece. Divirto-me quando ouço histórias da escolástica taxista (na verdade, já nem isso), mas é um gozo kitch, um bocado snob, como quem ouve as maiores boçalidades e acha piada, porque não lhe tocam. Quando conduzo, a mesma boçalidade, só que agida, toca-me. Ou melhor: só não me toca porque, até hoje, tenho-me desviado.

secção COMO SE TIVESSEM O CABELO A ARDER

"O essencial é trabalhar com gente capaz de sucumbir ao poder da sugestão. É uma espécie de experiência hipnótica em que, quando se pede aos músicos que toquem como se tivessem o cabelo a arder, eles sabem exactamente o que queremos dizer."

Da série Tom Waits: Autobiografia Em Pequenas Prestações, Ditos De Espírito E Sabedoria, no Provas de Contacto.

Está criada outra prateleira, mas não me parece que se lhe arranje uma multidão.