Devo andar muito próximo da nulidade em toponímia urbana. Estou a pensar no início da rua da Casa dos Livros, paralela à do Plano B, um pouco abaixo da Lello, em frente ao estacionamento dos Clérigos. É aí que fica uma enorme loja-armazém, recentemente transformada num concentrado de brinquedos de lata, extintores fora do prazo, atoalhados fixolas, bússolas que funcionam e apontam o Norte, bússolas que funcionam à sua maneira apontando o Sul, máquinas de escrever, bonecos, caixas de madeira, cinzeiros, louças, quadros, molduras, guardadores de rebanhos de fotos amarelecidas e outras
coisas em forma de assim. Tudo muito arejado e com lugar para existir, que o espaço é generoso e as janelas são do tamanho do século XIX, daquelas que se projectam em quadriculados de luz e sombra, invadindo suavemente chão, objectos e gentes, com quem se poderia jogar ao galo. Atrás do balcão palavras simpáticas do tempo e do trânsito, independentes dos dinheiros gastos e de estarmos em quase dois mil e oito, ano da graça das senhoras, dos senhores,
etcetera.
*
Por muito que isto irrite as cassandras do costume e sem pretender que tudo vai bem no melhor dos mundos possíveis, mesmo que a observação esteja sujeita aos humores de uma tarde bem passada, tenho a ideia de que nem tudo corre para a morte, nesta cidade. Uma certa espécie de bares (o conceito que vem substituir os antigos cafés, que pertencem realmente ao passado), galerias, lojas que não vendem mais do mesmo, requalificação de espaços públicos, recuperação de alguns quarteirões para habitação. Sem politiquices e agendas armadilhadas: já cá vi tudo muito mais condenado.
[Edit]
Esqueci-me de que tinha trazido um recibo, preenchido à mão com duplicado por artes de uma folha de papel-químico. Falei da 'Fábrica e Armazém das Carmelitas', na rua delas.